CONFIAR : A INTERNET, O SEGREDO, E A VULNERABILIDADE ADOLESCENTE

Por Cleyton Angelelli e Arianne Angelelli

“onde houver um desafio do rapaz e da moça em crescimento, que haja um adulto para aceitar o desafio “

Winnicott.

Nos dias de hoje ,com a internet, encontramos jovens plugados durante o dia todo, conectados em um espaço virtual, que não permite o acesso dos pais. Ao mesmo tempo as famílias estão reduzidas e cada vez mais isoladas em seus espaços de comunicação. Hoje vemos crianças muito pequenas com tablets e adolescentes 24h ligados em seus computadores e I phones. Os pais , que vieram de outra geração , não sabem colocar limites e carecem de parâmetros diante da realidade cada vez mais virtual desta geração. Muitas vezes não estão familiarizados com a tecnologia da mesma forma que os filhos e se sentem desorientados ao perceber que o mundo virtual adolescente é um campo desconhecido. Alguns pais tentam exercer controle sobre os acessos e o tempo nas telas , outros são excessivamente permissivos com os filhos . Todavia, não há uma fórmula mágica para fornecer parâmetros 100% seguros quando se trata do processo de ganho de autonomia que a adolescência representa. Os adolescentes vão se expor a perigos mas estarão esperando que os pais possam estar atentos a eles. O processo de crescer envolve muitos lutos e reviravoltas – e os pais precisam estar dispostos a “topar a parada”.

A proposta deste trabalho é a análise do filme ” Confiar ( Trust) ” do diretor David Scwhimmer ( 2010). No enredo, uma garota de 14 anos que vive com os pais e o irmão, numa família estável, aparentemente saudável, envolve-se na internet com um pedófilo. Ele se faz passar por um rapaz mais novo e abusa sexualmente dela.

O pai, publicitário, ele mesmo veiculando na mídia imagens sensuais de meninas muito jovens , ao ver a filha conversando com o desconhecido , não imagina o risco que ela corre . Confiante na sua capacidade de discernimento e na sua “inocência”, se surpreende quando comunicado, por terceiros, de que a moça sofreu abuso num primeiro encontro com o pedófilo. As fraturas na comunicação intrafamiliar se evidenciam. Os pais , envolvidos com a saída do filho mais velho de casa, deixaram de notar o perigo que a filha estava correndo. Percebe-se que nesta família a chegada dos filhos à adolescência encontra os pais de certa forma despreparados para lidar com o luto e a transformação . Eis o que acontece: desponta a sexualidade da filha , que vive o apaixonamento em segredo- mas os pais não estão atentos aos sinais de que ela precisa de orientação.

A retomada da comunicação familiar se faz por meio de muita dor .Todos terão de elaborar o luto pela infância perdida e pela família idealizada que parece desmoronar neste momento. Após vários desdobramentos do ocorrido, a adolescente, sem condições de elaborar o trauma, faz uma tentativa de suicídio. Os pais, avisados por uma amiga, conseguem encontrá-la a tempo.

Existe um paradoxo na comunicação adolescente. Parafraseando Winnicott, neste momento da vida há
“um sofisticado jogo de esconder, em que é uma alegria estar escondido, mas um desastre não ser achado”.

Winnicott conta o caso de uma mocinha que tinha um diário secreto, que era deixado de modo a ser encontrado pela mãe, que deveria ficar ciente dele, mas sem comentar com a filha. O paradoxo está no fato de que o adolescente quer privacidade e quer se arriscar, mas deseja que os pais estejam sempre atentos e dispostos a protegê-los , percebendo os sinais de que algo anda errado e colocando limites em sua onipotência. É um jogo de esconder muito sofisticado, pois a criança que cresceu precisa agora de um espaço para si, mas não quer ser abandonada à própria sorte.

No filme, o namoro virtual é o “diário secreto” que não foi encontrado pelos pais, quando a comunicação falhou. Ao tentar suicídio, enviando uma foto de si pela rede, a mocinha tenta de novo enviar um recado os pais …

( Trabalho apresentado no décimo terceiro congresso brasileiro de adolescência )

Na cena acima, a adolescente conversa com Charlie, que usa de uma falsa identidade para se aproximar dela por um chat online.