O filho também é do pai

os primeiros passos ( Van Gogh)
Os Primeiros Passos ( Vincent van Gogh)

Para Winnicott o bebê é “uma organização em marcha” e a fase edípica um momento importante do desenvolvimento, mas que nem sempre é atingido plenamente.

Sem deixar de levar em conta o pensamento freudiano e a importância do complexo de édipo, Winnicott se volta para os estágios iniciais e suas viscissitudes.

O estabelecimento da terceiridade na vida da pessoa é pensado pela ótica das relações iniciais. Ele enfatiza a importância do ambiente para o amadurecimento e sob este ponto de vista a conquista da independência relativa a partir da situação inicial de dependência absoluta do bebê.
Claudia Dias Rosa salienta como Winnicott tende a valorizar a presença real do pai na vida do bebê e de sua mãe. Ela explicita 4 fases do desenvolvimento e em cada uma delas a participação paterna. Estas fases vão do momento mais inicial, em que o pai, fazendo parte do colo da mãe, é percebido de forma indiferenciada, ao momento do pai “edípico” agente da terceiridade e da diferença . Segundo esta autora, na obra de Winnicott, o pai tem múltiplas funções que progridem conforme o bebê se desenvolve. Ele tem lugar como facilitador para que o bebê adquira uma capacidade progressiva de percepção do objeto, em cada fase. Diz Winnicott:
“À medida em que o bebê fortalece seu ego… à medida que a tendência herdada à integração faz o bebê avançar…. a terceira pessoa desempenha ou parece desempenhar um grande papel…e é aqui que sugiro que o bebê tem probabilidade de fazer uso do pai como um diagrama para a sua própria integração… Se o pai não se encontra lá, o bebê tem de fazer o mesmo desenvolvimento, mas de modo mais árduo…”
O pai “capaz de sobreviver, castigar e perdoar” , de que nos fala Winnicott, é aquela figura que, já percebida em sua totalidade pelo bebê, tem sua importância como um elemento terceiro , real e presente. O pai (terceiro) que pode acolher de alguma maneira os impulsos hostis da criança faz diferença na maneira como ela se torna capaz de suportar em si mesma as pressões instintivas.
Com Winnicott e sua lente de aumento incidindo sobre os aspectos ambientais e mais precoces, podemos salientar o quanto a figura do pai e sua capacidade de conexão com o filho será agente facilitador futuro do processo de travessia edípica. Há um processo dialético e sincrônico: o pai está lá para ser encontrado quando o bebê se torna capaz de encontrá-lo.

curso pelo Instituo Gerar
https://institutogerar.com.br/cursos/o-filho-tambem-e-do-pai-reflexoes-psicanaliticas-sobre-a-paternidade/

inscrições para o curso no link acima

Professores:

Alexandre Coimbra Amaral: Psicólogo, terapeuta de casais, famílias e grupos.  Escritor, autor de “Cartas de um terapeuta para seus momentos de crise” e “A Exaustão no topo da montanha”. Fundador do Grupo Terapêutico de Homens, que vem desconstruindo machismos há quatro anos e meio em encontros quinzenais).

Arianne M. M. Angelelli: Psiquiatra infantil e perinatal, membro do departamento de saúde mental da Sociedade Paulista de Pediatria e do Ambulatório de Saúde Mental da Mulher do IPQ-USP, mestranda pela PUCSP.

Cristina Keiko Inafuku de Merletti: Psicóloga; psicanalista; especialista em Tratamento e Escolarização de Crianças com TGD/PSA-IPUSP; mestre e doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pelo IPUSP; sócia-membro do Lugar de Vida – Centro de Educação Terapêutica SP; docente titular do Programa de Mestrado em Educação e Subjetividade da Universidade Ibirapuera.

Sergio Gomes da Silva: Psicanalista, Pós-Doutor em Psicologia (USP), Doutor em Psicologia Clínica (PUC-Rio), Membro Efetivo do CPRJ, Membro do GBPSF. Diretor do Instituto Nebulosa Marginal.

Simone K. Niklis Guidugli: Psicóloga perinatal, clínica e hospitalar. Mestre e Doutoranda pelo IPUSP. Sócia-fundadora da Curae Psicologia.

Programa:

08:00h – 09:15 – Síndrome de couvade: a identificação feminina primária e a ancoragem da paternidade no corpo.  O pai que une. (Arianne Angelelli)

09:15- 10:30 – Da Preocupação Materna Primária à Preocupação Parental Primária. (Simone Guidugli)

Intervalo 15 min

10:45 as 12:15- A experiencia do grupo terapêutico de homens: paternidade. (Alexandre Coimbra)

12:15- 13:30- almoço

13:30 -14:15   Depressão puerperal paterna: não é só a mãe quem deprime. Características dos quadros de doença mental paterna e suas repercussões (Arianne Angelelli).

14:15- 15:30   Paternidade, Terceiridade e Édipo (Sergio Gomes).

15:30 – 16:45h- O triângulo edípico sob o vértice paterno e suas repercussões no psiquismo do filho. A dimensão simbólica da filiação- o pai que separa. (Cristina Merletti).

intervalo 15 min 

17:00 – 18:00 Filho, não vê que estou queimando? Paternidade e negritude – ser pai no contexto da sociedade brasileira. Caso clínico. (Simone Gidugli e Arianne Angelelli).

18:00 a 18:30 roda de perguntas aos palestrantes

ALEXANDRE COIMBRA AMARAL: falando sobre a(s) masculinidade(s)

PSICANÁLISE E PAULO FREIRE

Depressão pós parto

É claro que te amo 

E tenho tudo para ser feliz 

Mas acontece que eu sou triste…

Vinicius de Moraes (1)

Depressão pós-parto

Por Arianne M M Angelelli

Psiquiatria da Infancia, Adolescência e Perinatalidade

Introdução

“Tenho medo do meu filho”, dizem muitas mulheres, diante da fragilidade e total dependência do recém-nascido. Sobre o filho temido estão projetados os medos, as fantasias, os remorsos e as culpas, o desejo de voltar atrás, de ser de novo livre, e também os restos de operações edípicas e pré-edipicas vividas pela mulher no passado. A afirmação pode parecer ilógica: que mal pode fazer à mulher um ser tão indefeso como o bebê? Nos tempos atuais, a supervalorização da criança (fato recente na história do mundo) e a tirania dos ideais exerce sobre a mulher uma imposição que transforma a maternidade. Em muitos casos vivências de persecutoriedade, perda, falibilidade e impotência dominam a cena perinatal: um drama em que uma mulher, geralmente sozinha, enfrenta grande adversidade ligada ao fato de tornar-se mãe.

Clitemnestra “Depois do assassinato”. Por John Collier, 1882, na Guildhall Art Gallery, Londres. Fonte: Wikipedia.

A trilogia grega Orestéia, de Ésquilo (escrita no século V_ AC) conta a saga de traições e vinganças da família real de Micenas. Na tragédia grega a rainha Clitemnestra mata o seu esposo, recém chegado da guerra de Troia, porque descobre que, para vencer esta guerra, o esposo havia sacrificado a filha do casal . Após assumir o trono, Clitemnestra toma o poder até ser assassinada, desta vez por seu filho Orestes, que vem para vingar a morte do pai. Mas é muito interessante como Clitemnestra descobre que seu filho está chegando para realizar essa vingança. Ela descobre a intenção de Orestes por meio de um sonho premonitório. Neste sonho, Clitemnestra dá à luz uma serpente, que abocanha seu seio e se amamenta de sangue e leite.(2).

Um filho que é uma serpente, um seio que gera sangue e leite, são imagens fortíssimas que atravessam os séculos e ainda hoje valem como metáforas das situações conflituosas e ambivalentes que podem ocorrer com a chegada do bebê. O processo gestacional, o parto e o puerpério exigem muito da mulher em termos físicos e psíquicos. Ao contrário do que se poderia pensar, nem a gravidez, nem o pós-parto são períodos de proteção contra a eclosão de surtos e doença mental. Essa mulher que a tragédia grega pinta com as cores da ambivalência, do amor e do ódio, é a mãe espoliada e machucada pelo filho, adoecida pela depressão ou psicose . O filho-serpente é um perigo e uma ameaça para esta mãe.

Podemos também evocar a relação entre a serpente que suga o sangue e o leite e a amamentação, inspirados pelo sonho de Clitemnestra. É comum que dificuldades na amamentação possam estar mascarando um quadro depressivo ou ansioso na mulher. E a ideia do “sangue” que se mistura no leite pode também ser ligada às questões transgeracionais, como uma loucura que “passa pelo sangue” e se reedita a cada geração.

Sabemos que é necessário, para cuidar de um bebê, um grande trabalho psíquico. Colocar-se a serviço do ser humano em porvir é muito cansativo, pois o ser humano não nasce pronto, e precisa de outro ser humano para se tornar pessoa. O desamparo da criança é vivenciado pelo cuidador. Neste momento delicado, o cuidador se dá conta do que representa esta empreitada. Por isso, aquele que exerce a função materna precisa de toda ajuda e, ainda assim, está só. O mergulho, a regressão ao mundo sem palavras, sensorial, ao mundo do tudo ou nada que é o cuidado diário do recém-nascido exige um grande esforço, pois o bebê representa o arcaico dos nossos primeiros tempos e demanda do seu cuidador a capacidade para se colocar em contato com emoções muito primitivas (3). Mas atribuir a uma só pessoa- a mãe- o fracasso ou o sucesso nesta tarefa complexa é fruto da simplificação e da idealização da função materna. Esta deve ser constituída a cada caso e precisa do apoio ambiental. A idealização da maternidade supõe “um saber atávico sobre o maternal” (4) que a clínica e a observação atenta nos fazem questionar.

Para Christina Wieland (5) a cultura ocidental e sua desvalorização do feminino contribuem para que a imago materna, que nos atravessa a todos, oscile entre a mãe santa idealizada e a bruxa, justificando ora a veneração e ora a violência contra a mulher. Este estado de coisas não ajuda em nada quando a mãe se depara com o bebê real e se defronta com a maternagem que ela realmente pode exercer. A reação da sociedade à dependência experimentada nos estágios iniciais da vida, quando a mãe tem total poder sobre nós, e que reprimimos em nossa busca por autonomia e individuação, pode se transmutar em todo tipo de hostilidade, velada ou não, contra a Mãe.  Mesmo a visão mais romântica da amamentação, por exemplo, e o cuidado mais bem-intencionado podem estar a serviço de uma tirania não consciente que rouba à mulher o exercício da sua subjetividade e criatividade. A crença no instinto maternal e os preconceitos motivados por essas razões inconscientes levam também à dificuldade que a própria mulher tem de procurar ajuda de quando adoece psiquicamente, na gravidez e no pós-parto.

A partir disso falaremos aqui de alguns conhecimentos úteis para o profissional psi, no que concerne à depressão periparto e sua terapêutica dentro do campo da psiquiatria, assim como de algumas implicações que a patologia pode ter sobre o desenvolvimento da criança.

Quadro clínico da depressão pós-parto

Diferenciando Saúde e Doença.

Atualmente, pela grande quantidade de quadros de humor diagnosticados no pós-parto terem se iniciado já na gravidez, prefere-se utilizar o termo depressão periparto para englobar estes casos também. A alteração do humor relativa ao sentimento de culpa, a preocupação e a tristeza fazem parte da vida e da condição humana. Em fases de transição, como o a gravidez e o puerpério, reações de ajustamento são comuns. Por isso é necessário fazer a distinção entre as reações patológicas e as reações adaptativas normais de todo este processo. Antes do parto, os quadros psiquiátricos se correlacionam com um pior desfecho obstétrico- a tristeza ou ansiedade na gravidez, para além de um certo limite, tem muitas consequências. Já no pós-parto a diferenciação entre blues puerperal e depressão é muito importante, pois o “blues” é autolimitado e não deve ser Medicalizado*. Como estabelecer esta diferença? O blues puerperal é uma condição transitória e muito frequente relacionada ao cansaço, sentimentos de desamparo e flutuações hormonais. É própria à situação de adaptação da mãe ao recém-nascido e às mudanças no primeiro mês após seu nascimento. A transitoriedade (pico de sintomas na primeira semana, com resolução dentro de no máximo um mês) e a característica flutuante do quadro, sem marcas de gravidade, indicam que a conduta nestes casos deve ser de apoio à puérpera e suporte ambiental. Se, por outro lado, os sintomas de humor seguem um curso de piora progressiva, evoluindo para a caracterização de um episódio depressivo maior, a mulher deve ser encaminhada para tratamento.

Sintomas

Os fatores mais importantes que justificam a hipótese de um episódio depressivo, independente de sua ocorrência dentro ou fora do pós-parto, são o humor triste e a ausência de prazer na vida. Alterações de apetite, sono, alterações cognitivas como distratibilidade e perda de memória, fadiga e sentimento de culpa ou vergonha costumam estar presentes, mas nem sempre indicam depressão se encontrados isoladamente. Os critérios para o diagnóstico da depressão não variam no período perinatal em relação a outras fases da vida (ver tabela 1) embora haja algumas particularidades desta fase: a presença de ansiedade e preocupações obsessivas com o bebê (8). É importante distinguir a depressão com características ansiosas de situações potencialmente angustiantes, comuns na gravidez e pós-parto, ligadas a estressores como falta de suporte, complicações gestacionais ou questões de saúde do bebê. A preocupação materna primária- um estado particular das mães de bebês pequenos e que se caracteriza por forte conexão mental e emocional entre a mãe e filho (9) faz parte da saúde, assim como os dilemas e conflitos característicos do momento de transição para a parentalidade.

A retração da libido, caraterística da depressão, encontra na fase puerperal um fator agravante: a presença do bebê que necessita ser cuidado. A mãe que está bem dirige a seu filho sentimentos que brotam de sua vida sexual, num sentido amplo- o bebê é investido eroticamente por ela, que se ocupa do seu corpo, alimentação e bem-estar, encontrando verdadeiro prazer no seu contato (10). Na depressão, está reduzida a energia libidinal disponível para este investimento, pois a mãe se retrai. A tarefa do cuidado com o bebê passa a ser penosa ou carregada de preocupações. Então, a face oculta da maternidade, que para a maioria permanece reprimida, vem à tona: componentes agressivos e terroríficos como os do sonho de Clitemnestra, e a ambivalência – sangue e leite- que existe nos sacríficios que o estado de neotenia do bebê exige da mãe. A mudança radical que ocorre na vida da mulher ao tornar-se mãe (geralmente mais marcada na vinda do primeiro filho) é um luto impossível quando esta adoece num quadro de depressão. A nova condição é vivenciada como perda da identidade. A mãe se sente incapaz de fazer face à responsabilidade da tarefa. Muitas mulheres tem a sensação de que a maternidade é uma espécie de malogro (perda de liberdade, transição para um papel que a oprime) e o humor deprimido impede que as perdas e mudanças de rumo na vida na transição para a parentalidade sejam compensadas pelo investimento narcísico no filho (11). Isso pode se iniciar já na gravidez. Após o nascimento da criança, vicissitudes relativas a ela podem seguir um caminho de mão dupla: quando algo ocorre com o bebê (por exemplo, a internação prolongada numa UTI, uma doença ou síndrome, retraimento excessivo, questões na amamentação) e a mãe não pode “se alimentar” do seu amor, o risco de depressão também aumenta.

        A disforia é um sintoma de humor comum na depressão perinatal e pode ser descrita como um sentimento de mal-estar constante associado à irritabilidade. Pode prevalecer sobre o sentimento de tristeza e se associar à angústia, (descrita como o aperto ou peso no peito) e choro frequente. Os equivalentes orgânicos do afeto (sono e apetite) comumente se alteram na depressão perinatal. No pós-parto, quando o bebê tem despertares na madrugada, a insônia e o cansaço materno não podem ser explicados somente por este fator, pois a dificuldade de dormir novamente após um despertar noturno ou repousar durante o dia, decorrentes da depressão e ansiedade, pioram o cansaço da mãe.

        O sintoma fadiga, ou cansaço excessivo, deve ser bem investigado. Se ele não cede após períodos de descanso pode ser na verdade um sintoma depressivo. Fadiga e perda de energia estão presentes em muitos puerpérios de mães saudáveis; pelas demandas da fase, principalmente quando há pouco auxílio ambiental. Um estudo inglês recente relaciona a solidão e sobrecarga da pandemia de COVID 19 a aumento da sintomatologia depressiva nas mães (12). Por isso, a avaliação clínica deve levar em conta o contexto, o conjunto dos sintomas e o humor associado, e não somente a queixa isolada. Não podemos nos esquecer também de fatores orgânicos que podem concorrer neste momento. Nos casos de muita perda de energia e astenia, doenças físicas e desequilíbrios hormonais tem de ser investigados. Alguns quadros puerperais de base sistêmica podem ter sintomas que se confundem com a depressão: anemia, tireoidite pós-parto ou hipotireoidismo, síndrome de Sheehan (falência hipofisária decorrente de choque hipovolêmico-perda excessiva de sangue- durante ou após o parto), doenças autoimunes, encefalite e outras doenças infecciosas, reações a medicamentos, entre outros. Assim, o diagnóstico diferencial da depressão pós-parto inclui a pesquisa de quadros clínicos que a agravem ou melhor expliquem.

        Os sintomas cognitivos da depressão podem ser muito perturbadores. Na depressão, queixas de memória e distratibilidade não se explicam apenas pelo cansaço da fase. Dificuldade de se organizar, de tomar decisões, tendência a procrastinar e preocupação com detalhes são sintomas derivados de alterações cognitivas que contribuem para um agravamento dos problemas cotidianos, levando a certo caos que deixa a mulher ainda mais paralisada. Anteriormente eficientes e capazes de enfrentar situações desafiadoras, no trabalho ou em outras áreas da vida, as mulheres deprimidas veem-se ineficientes e bloqueadas na própria capacidade de pensar. Encaram a maternidade como dificuldade intransponível.  Preocupações e ruminações obsessivas de causar dano ao bebê podem aparecer, e mesmo pensamentos de morte e ideação suicida. O suicídio é uma das maiores causas de morte materna até que se complete o primeiro ano de vida da criança. (13). Muitas vezes ocultados na entrevista com o médico ou terapeuta, pensamentos suicidas devem ser investigados.

        Para evitar o diagnóstico em quadros transitórios, a maioria dos manuais classificatórios de psiquiatria pede a presença de duas semanas de sintomas para caracterizar o transtorno depressivo maior (vide tabela 1), visto que situações passageiras podem ser autolimitadas. Quase sempre há flutuação dos sintomas no tempo, com alternância de momentos melhores e piores, sendo comum a piora matinal.  

        A depressão pós-parto é um tabu porque é vista pelo imaginário social como sinal da inapetência do amor materno, tão idealizado em nossa cultura. Existe subnotificação, retardo em procurar ajuda e não reconhecimento do quadro em muitos casos, que permanecem sem tratamento. (14) Em um estudo, apenas um terço dos pediatras sentia-se capaz de reconhecer os sintomas de depressão pós-parto das mães que frequentavam a sua clinica (15). As mães podem esconder seus sintomas por vergonha ou desconhecimento.

        Prevalência e fatores de risco

        A prevalência de depressão periparto varia nos estudos, inclusive por diferenças metodológicas. Em condições sociais particularmente desfavoráveis, a prevalência pode estar bem acima acima dos 10-13% encontrados na maioria dos estudos populacionais (13,14,16). Dificuldades sociais e familiares, pobreza e gravidez na adolescência, entre outros fatores, aumentam seu risco. A depressão pós-parto masculina pode ser um gatilho e um agravante para a depressão materna, tendo uma prevalência média de 10% e ocorrendo principalmente entre o terceiro e o sexto mês após o nascimento do filho (17,18). A complexidade da situação puerperal nos deve fazer atentar para os sintomas que podem surgir no bebê, na vida de relação e na família, e que podem estar relacionados com um quadro depressivo não identificado. Porém, o fator mais importante de risco é a depressão gestacional ou episódio anterior na vida da mulher. A suscetibilidade à depressão depende de fatores endógenos e individuais, sempre observados nos relatos do transtorno através dos tempos (19). Alguns fatores de risco comumente encontrados para o transtorno estão elencados na tabela 2.

                Não há consenso sobre o ponto de corte no tempo a partir do qual um quadro depressivo na mulher não mais se correlaciona com o período pós-parto apesar de os manuais classificatórios especificarem uma data específica (6 semanas pós-parto no caso da CID 10 e 4 semanas pós-parto no caso do DSM V (20).  Alguns estudos consideram até um ano após o parto, levando em conta a magnitude do estressor “filho” que perdura por muito mais que um ou dois meses depois do nascimento! A variação no critério tempo de início do quadro dificulta a comparação entre os estudos.  Quanto ao curso da doença, o episódio depressivo no puerpério tem algumas particularidades: em geral persiste por seis meses, mas um terço das mães ainda apresentará sintomas mesmo depois de dois anos (22). Também pode haver maior demora na resposta às medicações, além da grande particularidade da questão da amamentação que discutiremos adiante.

        Diagnóstico Diferencial

        É importante ter em mente que parte dos quadros de humor puerperal não serão depressões unipolares, mas sim bipolares- portanto algumas de nossas pacientes serão na verdade portadoras de transtorno bipolar. Casos de depressão pós-parto que na realidade se encontram dentro do espectro bipolar apresentam maior incidência de crises de pânico, irritabilidade, impulsividade e labilidade do humor, e irão implicar em mudança no diagnóstico e perspectiva do tratamento. Um indício de bipolaridade é a má resposta ou piora com o uso de antidepressivos (23). A investigação dos antecedentes pessoais e familiares de transtorno bipolar do humor pode auxiliar o clínico na questão do diagnóstico diferencial. A bipolaridade, porém, não é a única causa de resposta paradoxal ao tratamento. Algumas doenças sistêmicas ou cerebrais podem estar presentes associando-se à depressão, agravando-a ou explicando totalmente os sintomas apresentados, o que muda o diagnóstico ou influencia a conduta terapêutica.

        Os sintomas obsessivos podem estar presentes no quadro depressivo perinatal, por vezes com intensidade e gravidade suficiente para justificar o diagnóstico de TOC (transtorno obsessivo compulsivo) comórbido. São preocupações e pensamentos de caráter rígido, incapacitante, para além de um excesso de zelo com o bebê. Preocupações hipocondríacas e pensamentos de causar dano à criança podem estar presentes, causando grande sofrimento.  

Tratamento da depressão periparto

Se nos casos de Blues pós-parto as medidas de suporte costumam ser suficientes, trazendo melhora e alívio, nos casos de depressão encontramos um estado melancólico ou ansioso que se agrava pelas demandas do bebê. O tratamento deve ser tríplice com medidas psicoeducativas e ambientais, provendo cuidado à mãe e ao bebê, psicoterapia e medicamentos, observando-se as particularidades do momento. À mãe com antecedentes de depressão, ou bipolaridade na família, o pré-natal deve incluir a indicação de suporte psicológico sempre que possível. Nos casos mais leves a psicoterapia pode ser indicada isoladamente, sem prescrição medicamentosa, mas em geral não é fácil a decisão terapêutica no caso do ciclo gravídico puerperal; pois se o uso de fármacos na gravidez e amamentação não é isento de riscos para a mãe e para o bebê, também são grandes as consequências para ele da doença depressiva materna e doença mental da mãe, em geral. (24-32)

A decisão de tratar com medicamentos a mulher no ciclo gravídico-puerperal deve levar em conta o risco/benefício em cada caso, a gravidade e a decisão pessoal da mãe. Casos de depressão moderada a grave geralmente não podem prescindir do uso de medicamentos, assim como nos casos geralmente mais graves de depressão bipolar. Não existe medicamento totalmente seguro quando entramos neste campo, mas diversos consensos, constantemente atualizados, auxiliam o clínico que atua nesta área (33,34).  Há medicamentos sabidamente teratogênicos e outros cujo risco parece ser mais baixo. Há drogas que apresentam uma maior transferência para o leite materno, e outras que tem menor passagem ao leite, e assim por diante.

 Alguns princípios gerais devem guiar a conduta do clínico, como evitar usar polifarmácia e tentar utilizar as menores doses possíveis dos medicamentos aparentemente mais seguros em cada fase (gravidez, amamentação, puerpério). Deve-se levar em consideração a resposta da mãe a determinados fármacos e evitar fazer trocas de medicamentos desnecessárias. O alívio do sofrimento dentro da possibilidade de menor risco possível deve nortear a conduta. Algumas medicações anteriormente consideradas seguras podem vir a se associar a maiores riscos conforme as evidências cientificas vão se acumulando. Outros medicamentos, anteriormente proscritos, como por exemplo o lítio na gravidez, passam a ser mais bem aceitos quando os trabalhos mais recentes passam a evidenciar um risco mais baixo do que se pensava anteriormente.

Uso de medicamentos na amamentação.

Na depressão pós-parto há quatro tipos de medicamentos mais usados no controle e alívio dos sintomas (35-39). Os antidepressivos podem pertencer a classes diferentes, como os tricíclicos e os inibidores de recaptação de serotonina, entre outros. Dentre as opções disponíveis, contamos com drogas relativamente eficazes e seguras para o uso na amamentação. Não se justifica a interrupção da amamentação por conta da necessidade do uso de antidepressivos pela mãe. Alguns antidepressivos considerados mais seguros (como a sertralina a paroxetina e o escitalopram) apresentam baixa razão leite/plasma (proporção entre a concentração de droga presente no leite em relação à concentração no sangue da mãe). Não parece haver prejuízo cognitivo ou de desenvolvimento para os bebês em aleitamento no caso de várias destas medicações, o que encoraja o seu uso- quando sabemos das consequências da depressão não tratada para o desenvolvimento do bebê.

Os benzodiazepínicos e os indutores de sono também podem se fazer necessários para tratamento do sono e ansiedade maternos, com ação rápida e sinérgica ao efeito dos antidepressivos, principalmente nos quadros mais agudos. Podendo ter um efeito de sedação nos neonatos que amamentam, devem ser usados com cautela, mas são em alguns momentos mais eficazes e rápidos do que outros medicamentos. Aconselha-se o uso pontual e por curto período destes medicamentos para controle de sintomas agudos das depressões que podem cursar com muita ansiedade e angústia.

Finalmente, os antipsicóticos e os estabilizadores de humor podem ser necessários, havendo opções mais indicadas para uso nesta fase. Alguns antipsicóticos e estabilizadores de humor como a quetiapina mostram-se relativamente seguros tanto na gravidez quanto na amamentação. Caso especial é a depressão que se relaciona com o transtorno bipolar- seu manejo é mais difícil pois pode ser exacerbada pelos antidepressivos. Nos casos de pacientes bipolares infelizmente a polifarmácia é mais regra do que exceção. Quando a mãe não está amamentando, a escolha do medicamento deve ser direcionada para aquele que apresenta maior evidência de resposta para ela. Não é necessário, porém, interromper a amamentação ao iniciar o tratamento da mãe, assim como em muitos casos não é prudente interromper o medicamento antidepressivo na gravidez – aqui pesem o desejo materno e a avaliação do risco de tratar e não tratar que é diferente em cada caso.

Há muitos medicamentos que podem ser utilizados na amamentação inclusive para que as mães deprimidas possam estar em condições para fazer psicoterapia. Nos transtornos de humor, pode haver dificuldade de engajamento no processo de psicoterapia e de aderência aos outros tratamentos disponíveis. O uso da medicação traz alívio dos sintomas incapacitantes propiciando uma melhora nos outros aspectos da vida, na medida em que a mãe consegue se mobilizar para buscar ajuda. Para muitas medicações a literatura não encontra associação entre uso materno e prejuízo cognitivo ou emocional das crianças – seja na gravidez ou na amamentação. O uso de antidepressivos na gravidez, como observado nos estudos mais recentes também não parece se correlacionar com o aumento do risco de transtornos do espectro autista (40,41).

Há medicamentos novos com ação hormonal que parecem ser promissores, como a brexanolona (https://www.medscape.com/viewarticle/910643)- ainda não utilizada no Brasil.

Consequências da Depressão Puerperal

Do ponto de vista psiquiátrico, o período perinatal é momento de vulnerabilidade. A maneira como se dá o puerpério e suas reconfigurações, em termos de papéis assumidos e para o psiquismo, tem consequências duradouras em vários campos da vida materna e do filho. A presença de depressão neste momento é preditor de crises depressivas futuras e de dificuldade de reorganização da vida pessoal e profissional da mulher.

Estudos recentes cada vez mais apontam para as consequências da depressão materna na prole, com prejuízo na interação mãe-bebê (menor reciprocidade, estimulação e vocalizações da mãe para com o bebê) e alteração de vários indicadores em seu desenvolvimento (interacionais, motores, cognitivos e sociais), assim como piora da qualidade do apego e maior risco de morbidade psiquiátrica futura (24-32). Porém a interação entre os fatores da doença materna e suas consequências na criança é complexa. Num estudo realizado em nosso meio, filhos de mães deprimidas desenvolveram mais rapidamente a linguagem (24), ao mesmo tempo que tinham pior índice de reciprocidade social. As consequências da depressão materna na prole dependem de vários fatores, como o suporte social, a resiliência da família e da própria criança. Visto que parte dos quadros já se inicia na gravidez, fatores nutricionais, descuido com o pré-natal, uso de drogas psicoativas e álcool, e mesmo alterações de dieta ligados a um precário estilo de vida interferem no desenvolvimento do feto e da criança. Já foi descrito o aumento da morbidade psiquiátrica na prole de mães submetidas a estresse em situações de guerra até as gerações futuras. Este fato tem sido associado a alterações de metilação do DNA fetal que se transmite aos seus descendentes (32). Seria este um correlato biológico para o que conhecemos em psicanálise como transgeracionalidade?

 Sabe-se que mães com depressão podem se mostrar capazes de manter o nível de interação com seus bebês por mecanismos compensatórios, direcionando ao filho sua energia em detrimento de outros aspectos de sua vida, principalmente nos casos de depressão mais leve. A relação da depressão materna com o padrão de apego apresentado pelo bebê parece ser consistente, direcionando a forma com que a criança tenderá a interagir com o ambiente, sua regulação emocional e autocontrole na vida futura. Bebês de mães deprimidas, principalmente se cronicamente deprimidas, são um grupo de risco para doenças psiquiátricas. Os primeiros mil dias de vida, contados a partir da concepção, parecem ser cruciais para o desenvolvimento físico e psíquico do indivíduo e a neurociência tem demonstrado prejuízos ao desenvolvimento ocasionados pelos traumas ocorridos no início da vida (32).

        Na clínica com bebês de 0-3 anos, encontra-se muitas vezes nos casos de depressão ou ansiedade maternas uma certa intrusividade que pode ser tão danosa como a negligência nos cuidados. A simbiose neste caso não funciona de modo a promover sintonia entre mãe e filho, mas destina-se ao controle e alívio da culpa e persecutoriedade maternas, podendo ocasionar um desequilíbrio dos ritmos no neonato e um excesso de excitação do mesmo. Seus sinais de retração não podem ser acolhidos nem traduzidos como necessidade legítima de repouso, de auto-regulação. Acriança pode reagir a esta invasão com uma imobilidade defensiva se a mãe “estiver muito agitada- encobrindo, pela atividade, uma depressão própria- ou demasiadamente excitante e estimulante, não permitindo, ao bebê, o intervalo e o tempo necessários a uma apropriação. (42). Nestes casos, tudo pode parecer bem com a mãe zelosa e conectada com a criança, mas aparecem problemas psicossomáticos ou de sono no bebê- invadido pela hipervigilância materna, ele não “desliga” e não descansa.

        Se não há queixas específicas, a ameaça pode estar projetada nas figuras mais próximas da mãe (avó, sogra, parceiro). Neste caso, surgirão conflitos familiares difíceis de manejar. “Hoje… a mãe deve enfrentar sozinha este desamparo que ela não compreende e que não é reconhecido socialmente… Ela tenta, frequentemente, apoiar-se na única pessoa que está a seu alcance: seu marido. Ela espera dele o que deveria esperar de uma mãe: que a ajude, que cuide do bebê para ela, o que frequentemente causa problemas, dificuldades para o casal ou fragiliza e afugenta o pai.” (11). Se o ambiente não é capaz de metabolizar a angústia da situação, pode reagir retaliando a mãe ou atacando o seu vínculo com o bebê que a todos parece excessivo ou inadequado.

Existe preconceito e desinformação de muitos clínicos em relação aos riscos dos medicamentos usados para tratar os transtornos puerperais. É comum a interrupção de medicamentos necessários para a mulher com depressão, quando engravida, aumentando a chance de depressão perinatal. Da mesma maneira, ao amamentar, muitas pacientes preferem não usar medicações psicotrópicas, temendo prejudicar o bebê, por desconhecerem os riscos da própria depressão, acreditando que seu sofrimento irá preservar o filho. O sacrifício materno acaba sendo contraproducente, pois no início da vida, em termos psíquicos, mãe e bebê compõe uma díade e o sofrimento e as dificuldades acabam sendo compartilhados, direta ou indiretamente.

Conclusão

Apesar dos tabus envolvendo os transtornos mentais perinatais, vem se notando maior mobilização social e pelos profissionais da saúde para fazer frente às demandas das mulheres, bebês e famílias. O profissional de saúde que se dispõe a trabalhar neste campo deve equilibrar a percepção da vulnerabilidade tão característica desta fase com a tendência autoritária do discurso que por vezes domina a visão medicalizante quando se fala da doença mental da mulher no puerpério. Quantas iatrogenias podem acontecer por falta de compreensão destes processos! A provisão ambiental não deve usurpar o protagonismo parental deste momento, o que muitas vezes ocorre, mesmo que disfarçada sob o discurso de uma ordem médico-científica que reivindica para si todo o saber. Temos situações de abandono e situações de intervencionismo que em nada ajudam a mãe (e o pai, muitas vezes também alijado de toda decisão). Às vezes a mãe chorosa sai da consulta com o especialista (obstetra ou pediatra) com uma prescrição de sulpirida (EquilidR) para se “acalmar” e “ter mais leite”, quando sua lactação é normal e tudo o que precisa no momento é ser ouvida e obter suporte. Em que medida a prescrição de um neuroléptico como o “equilid” é capaz de embotar o afeto e a libido, prejudicando o vínculo mãe-bebê, é tema para ser estudado ainda. As emoções e a regressão que ocorrem na perinatalidade não devem ser consideradas como doença e se há uma “cura” para este estado de coisas, essa cura é o descanso, o suporte ambiental, a boa escuta e o próprio tempo passado com o filho… Como diz Winnicott:

A mãe, que talvez esteja fisicamente exausta, e, talvez, incontinente, e que está dependente para muitas coisas, é ao mesmo tempo a única pessoa que pode apresentar o mundo ao bebê de modo significativo para este…, todavia, seus instintos não conseguem se desenvolver se ela estiver amedrontada… o leite materno não desce como uma excreção- é uma resposta a um estímulo que consiste exatamente na visão, no cheiro, e no contato com o bebê, bem como no som do seu choro. (43).

Obstetras, psiquiatras, pediatras e profissionais envolvidos com a gravidez e o parto, os que prestam auxílio às mães nos níveis de atenção básica, e toda a rede social tem papel importante na identificação e cuidado da depressão perinatal. Ela é muito frequente, principalmente em populações com vulnerabilidade social, e seu tratamento é fator importante para a prevenção das patologias psíquicas que podem acometer as crianças no futuro.

Tabela 1 (Fonte: American Psychiatry Association.)

Critérios para episódio depressivo maior segundo o DSM V (resumido)

Cinco ou mais dos sintomas abaixo presentes por pelo menos 2 semanas e que representam mudanças no funcionamento prévio do indivíduo     
             Pelo menos um dos sintomas é    
 –Humor deprimido             
 –Perda do interesse ou prazer
Os sintomas não se devem aos efeitos fisiológicos de uma substância (ou outra condição médica)  Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo do funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes da vida.  
Não houve nenhum episódio de mania ou hipomania anterior (exceto induzidos por substância ou outra condição médica)Os sintomas não se devem aos efeitos fisiológicos de uma substância ou outra condição médica  Quadro não é melhor explicado por transtorno esquizoafetivo, transtorno delirante ou outro transtorno do espectro esquizofrênico e outros transtornos psicóticos.  
1-Humor deprimido (sente-se triste, vazio ou sem esperança).
2- Acentuada diminuição do prazer ou interesse em todas ou quase todas as atividades na maior parte do dia quase todos os dias.
3-Perda ou ganho de peso acentuado sem estar de dieta (mais de 5%do peso corporal)
4- Insônia ou hipersonia quase todos os dias.
5-Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias.
6-Fadiga e perda de energia quase todos os dias.
7-Sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou inadequada (que pode ser delirante) quase todos os dias.
8-Capacidade diminuída de pensar ou concentrar-se, ou indecisão quase todos os dias.
9-Pensamentos de morte recorrentes (não apenas medo de morrer), ideação suicida recorrente (com ou sem plano suicida), ou tentativa de suicídio.  
        Especificadores: Com características ansiosas.Com características mistas.Com características melancólicas.Com características atípicas.Com sintomas psicóticos.Com padrão sazonal.No período próximo ao parto: Início durante a gravidez ou nas 4 semanas após o parto.Com catatonia.

Tabela 2   Fatores de risco para depressão pós-parto (16,19,21)

Fatores psicossociais- ausência de suporte social e familiar, dificuldades financeiras, conflitos conjugais, ausência de companheiro, perda de companheiro ou entes queridos na gestação, relacionamento ausente ou difícil com uma figura materna, abuso ou negligência na infância.
Vulnerabilidade- idade precoce, antecedentes de depressão ou depressão pós-parto, disforia pré-menstrual, traços de personalidade como neuroticismo ou introversão, baixa autoestima.
Fatores da gestação- Gestação indesejada, gemelaridade, menor intervalo entre as gestações, parto prematuro, tratamento para engravidar, parto cesáreo.
Fatores relativos ao bebê- malformações congênitas, estadia em UTI neonatal, intercorrências neonatais, não amamentar.

*Nota: O termo medicalização refere-se à adoção de um viés patologizante ou organicista na compreensão do sofrimento e comportamento humano: “o conceito é considerado um “clichê da análise social”. Publicações proliferam sobre diferentes objetos medicalizáveis, tais como a infância, comportamentos desviantes; gravidez e parto…Para cada um deles, surgem potencialmente novas condições médicas …ou entidades clínicas já existentes aumentam em prevalência, sobretudo em países desenvolvidos”. (6;7)

Referências

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Links das referências

Ref 6

  1. Zorzanelli R et al. Um panorama sobre as variações em torno do conceito de medicalização entre 1950-2010.

https://doi.org/10.1590/1413-81232014196.03612013

Ref 12

https://www.frontiersin.org/article/10.3389/fpsyg.2021.648002      DOI=10.3389/fpsyg.2021.648002  

Ref 13

Ayers S, Shakespeare J. Should perinatal mental health be everyone’s business? Primary Health Care Research & Development 16, 323–325, 2015. doi: 10.1017/S1463423615000298. [PubMed]

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