Abrap

A ABRAP-Associação Brasileira de Psicoterapia foi fundada em maio/2004.

O objetivo da ABRAP é reunir e fomentar o intercâmbio entre psicoterapeutas de diferentes referenciais teóricos.

Busca-se assim dialogar compartilhando tanto conhecimentos científicos atuais como incentivar o desenvolvimento da ciência de modo a contribuir para um exercício qualificado em psicoterapia.

A ABRAP vem somando seus esforços com diferentes órgãos e entidades participando e fornecendo oportunidades para o diálogo e produções sobre a psicoterapia http://www.abrap.org/normatizacao.php?NuNot=271 para contribuir tanto com as diferentes instituições como com os /as psicoterapeutas e a sociedade como um todo.

Conheçam a primeira videoconferência http://www.abrap.org/noticias.php?NuNot=257 proposta pela ABRAP através do canal ABRAP no youtube  https://www.youtube.com/c/ABRAPAssociaçãoBrasileiradePsicoterapia?sub_confirmation=1 em abril/2020 diante da grave crise sanitária que vivemos.

Propomos atividades sistematicamente. Sigam a ABRAP Facebook- @ABRAP.org.br; chamadas pelo Twitter- @ABRAP_ABRAP; e Instagram- oficialabrap

Participe conosco em prol do reconhecimento e qualificação do exercício em psicoterapia.

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Gestos Alongados

Eu queria levar banana-maçã pro meu pai. Não que ele tivesse me pedido. Estava na lista dele, mas no mercado não tinha. Sei disso porque faço as compras para ele desde março. Ele tem mais de noventa anos e neste 2021 está recluso há catorze meses. Hoje levo.

Conduzo o carro através do seis quilômetros que nos separam. Não é longe, mas nessa pandemia, as coisas se encompridam. Os gestos se alongam em etapas. Antes de sair, coloco máscara de proteção (duas), troco os sapatos, pego o elevador, torço para não encontrar com muita gente.

Uma vontade grande de estar na rua, com ganas de sair dela logo.

No caminho, claro de sol, abro as janelas quando pego velocidade. Sensação de liberdade provisória. É sábado à tarde e vejo poucas pessoas nos pontos de ônibus. Estão com máscaras no rosto, no queixo, nas mãos. Conversam e riem.

Os fins de semana são tempos de ônibus alegres, pessoas em grupo, o tempo mais largo, folgado. Como suas roupas, soltas, sem cintos, fivelas, compromissos. Perto do parque do Ipiranga, ciclistas e pessoas correndo. Um cachorro escapa da guia e vai ao encontro de dois labradores. Uma pequena confusão de latidos e correrias. Na Vila Mariana, passo em frente a restaurantes com mesas ao ar livre, nas calçadas. Famílias em fim de almoço, crianças gritando. Gente querendo viver, difícil pensar na morte.

Chego na rua onde ele mora, estaciono logo. Volto ao ritual. Máscaras, elevador, tirar sapatos. Meu pai abre a porta e se afasta. Agora já se acostumou a não vir me abraçar. Estar com ele também requer gestos alongados. Lavar as mãos, sentar longe, vontade de estar próxima, medo de ficar muito perto. Apartar-se do pleno viver, preservar a vida.

Sinto o piso frio da cozinha sob meus pés. Vejo a quietude da sala, os móveis escuros, um violino mudo em cima de uma poltrona, o teclado encapado em plástico. O sol filtrado pelas cortinas atenua os contornos.

Coloco as bananas na fruteira. Ele sorri. Obrigado, filha. Ele sabe que não precisa delas. Eu também sei. Mas ele gosta e não tinha vindo nas compras.

Venha se sentar.

O apartamento, com seus sofás, quadros, porta-retratos, respira todo à minha mãe. Meu pai vive sozinho em meio às suas lembranças há vinte e cinco meses.

Estar com ele também requer estirar sentimentos. Para que caibam a ausência e a presença dela, dele, dos dois.

Estar com ele requer visitar a falta dela. Na sala, no quarto, nos olhos dele. Por isso tudo é tão comprido. Alongam-se os silêncios, as pausas. Meu pensamento, dilatado, comprime o passado e o futuro.  Revejo a mesa, almoços, risadas e antevejo a sala vazia. Sentimentos condensados.

No quarto, dentro do armário, as roupas soltas de seus hábitos, aguardam um destino.

As caixas de remédio empilhadas perto dos copos me alertam para verificar se estão acabando. Conto os comprimidos de cada uma. Três, seis, nove, treze.

Precisamos pedir pra farmácia, pai. Ele faz que sim com a cabeça e, como se lembrasse de alguma coisa, se levanta, pega a chave e de forma ritmada dá corda no relógio antigo de parede. Os sabiás cantam lá fora, meio da primavera. Os ponteiros seguem se movendo. Vamos comer as bananas. 

“Winnicott  afirma que a criatividade é a base do viver saudável, e que é esta condição que faz com que a vida valha a pena. A possibilidade de viver criativamente é relacionada à qualidade da provisão ambiental recebida no início da vida. Com base na teoria de Winnicott sobre a criatividade, é possível pensar o trabalho do luto como estando vinculado à possibilidade de realizar um ato criativo, com o objetivo de reinstalar a idéia de que a vida vale a pena.” Barone,K.C. O trabalho de luto à luz dos fenômenos transicionais. Caderno Ser e Fazer, 8 outubro 2004

Imagem: Pilar Rodriguez

Ser criativo

Segundo Winnicott criatividade é o que faz o indivíduo sentir que vale a pena viver.

O mundo é criado por cada ser humano no momento do nascimento.

O bebê tem a ilusão de que o mundo que ele encontra foi criado por ele.

Vaso- Maria Helena Affonso.

Agora na pandemia a resiliência

dos indivíduos que perderam o emprego

e se reinventaram profissionalmente

é a prova da criatividade deles.

Para ser criativo, temos que sair um pouco do real…

e além disso, cultivar a música, a arte e a poesia.

É preciso dar espaço

para o novo, não ter medo.

Não ser perfeccionista e enfrentar o risco.

Às mães

Às mães, em tempos de pandemia.
O mundo está mudado, estremecido, vivendo a pandemia e seus efeitos em cada pessoa. As potências de cada um testadas pelo vírus e seu rastro. O planeta se recolhe, em resguardo. No dia de hoje, dia das Mães, passaremos a data comemorativa de forma estranha, pouco familiar.

Teremos mães próximas e mães afastadas de seus filhos.

Teremos mães que outrora protegeram seus filhos com cuidado e presença, e hoje estarão sendo protegidas por eles –pela ausência. Faremos vídeo-chamadas de tele-amor.
O que é isso de ser mãe em dias assim? Não há manual para esse mundo

de extremos e urgências, assim como não há para ser a mãe de um bebê.

Mães são guerreiras falíveis, e carregam muito cansaço e solidão por trás das mais sorridentes fotos estampadas nas redes sociais.
Mas há também o milagre de ser mãe – a mãe que se pode ser. A sua força a brotar sabe-se lá de onde, a serenar as angústias e aliviar dores desse estranho tempo atual.
A mãe a apertar firme no colo seu filho pequeno, quando ele chora temendo o vírus que ronda as ruas, estando ela mesma, igualmente, assustada.
Você se lembra, mãe? Nada parecia indicar que aquelas noites em claro terminariam e, no entanto, elas passam, e vem o dia e a luz, e algo se modifica e melhora.
Como na quarentena da mãe recém-parida, assim o mundo hoje pede um tempo próprio, um movimento diferente. Pede paciência e calma – como um colo cuidadoso da mãe num choro mais demorado do bebê.

A Virgem e Menino com Santa Ana- Leonardo da Vinci
A Virgem e o menino com Santa Ana- Leonardo da Vinci.

Nesta bela cena, Ana dá colo a Maria

para que possa inclinar-se e trocar olhares com o menino Jesus. Uma representação do holding ( apoio) de que a mãe precisa para poder bem cuidar de seu filho.